Rodrigo Constantino's Blog, page 453
January 6, 2011
Dilma, interrompida
Demétrio Magnoli - O Estado de S.Paulo
Ah, o exagero - a sombra monstruosa do exagero. "Lula estará conosco." "Sei que a distância de um cargo nada significa para um homem de tamanha grandeza e generosidade": "o maior líder que este país já teve." "Seu nome já está cravado no coração do povo." Não é o elogio incisivo, mesmo mais que protocolar, ao presidente que saiu, companheiro de partido, responsável por seu triunfo. É a louvação desmedida, o adjetivo incontido, o culto despropositado, a metáfora de ressonâncias religiosas. "Sob sua liderança, o povo brasileiro fez a travessia para uma outra margem da história." É Moisés, na travessia das águas e na jornada pelo deserto. Nos seus dois discursos de posse, Dilma Rousseff apalpou a linguagem das tiranias personificadas.
Condutor? Comandante? Eterno Presidente? Líder Genial dos Povos? Grande Timoneiro? A linguagem faz diferença, pois a política, em tempos de paz, é feita de palavras. Democracia é o regime das instituições, não dos líderes. Nas Repúblicas democráticas, nenhum líder sintetiza o povo - e exatamente por isso existem oposições legais. Delinquindo nos interstícios da lei, a Petrobrás batizou com o nome de Lula o campo petrolífero de Tupi. O culto a Lula é uma ferida na alma da democracia. Dilma subiu a rampa fazendo as orações desse culto bizarro.
Os discursos de posse de Dilma devem ser lidos como harmonias interrompidas. A presidente tenta desabrochar, insinua-se e esboça um aceno; ansiosa, tropeça e cai. Aqui e ali, por todos os lados, encontram-se os indícios da sua vontade de governar "para todos os brasileiros e brasileiras". Mas o propósito se estiola no caminho, sempre que colide com um dogma do lulismo.
Há o desejo discernível e, contudo, frustrado de construir uma narrativa realista do período pós-ditadura militar. "Um governo se alicerça no acúmulo de conquistas realizadas ao longo da história. Por isso, ao saudar os avanços extraordinários recentes, é justo lembrar que muitos, a seu tempo e seu modo, deram grandes contribuições às conquistas do Brasil de hoje." Ela poderia ter dito: José Sarney consolidou as liberdades políticas, Fernando Collor iniciou a abertura comercial, Itamar Franco fez o Plano Real, FHC ergueu o edifício da estabilidade econômica. Mas não disse, pois pronunciar o nome de um predecessor seria incorrer no pecado da apostasia: a negação da primazia de Lula.
Lula falou quase sempre como chefe de uma facção - e, no dia de passar a faixa, referiu-se ainda aos opositores como "inimigos". Dilma, ao contrário, almeja falar como a "presidente de todos". Ela estendeu a mão aos partidos de oposição, sem pedir a ninguém "que abdique de suas convicções". Com o olho posto nas lições da campanha eleitoral, enfatizou o imperativo do combate à corrupção e declarou um compromisso "inegociável" com as liberdades individuais, de religião, de imprensa e de opinião. "Prefiro o barulho da imprensa livre ao silêncio das ditaduras", assegurou, reproduzindo a fórmula empregada no discurso de vitória. A declaração será posta à prova logo mais, quando a presidente abrir a gaveta onde repousa o projeto de controle estatal de conteúdos dos meios de comunicação, um presente de grego deixado por Franklin Martins, em nome de Lula.
Dilma prometeu uma política externa "baseada nos valores clássicos da diplomacia brasileira", oferecendo uma justificativa cifrada para o afastamento de Celso Amorim. Recitou, um a um, os princípios inscritos na Constituição: promoção da paz, não intervenção, defesa dos direitos humanos. "Direitos humanos", ela disse! É uma censura indireta a Lula, que elogiava ditaduras e traçava paralelos abomináveis entre presos políticos e criminosos comuns.
Entretanto, os interditos pontilham a estrada como campos minados. Logo depois dos direitos humanos, apartando-se do texto constitucional, Dilma mencionou o "multilateralismo". Em tese, o termo significa, apenas, o fortalecimento das instituições multilaterais, como a ONU, o FMI e o G-20. Na linguagem codificada do lulismo, condensa o impulso antiamericano que moldou a desastrada aproximação com o Irã. O "multilateralismo", nessa acepção pervertida, combina com a permanência de Marco Aurélio Garcia no posto de chanceler fantasma. "Lula estará conosco", lembrou a presidente que se sabe tutelada.
"Eu troquei meu nome e coloquei Dilma lá na cédula", avisou Lula na campanha eleitoral. O ex-presidente interpreta o novo governo como seu terceiro mandato e para exercer a tutela nomeou dois primeiros-ministros informais: Antônio Palocci, tutor externo, e Gilberto Carvalho, tutor interno. Ambos cometeram atos falhos antes do encerramento do primeiro dia de governo. Palocci dirigiu um pedido aos ministros: "Tenham-me como um de vocês, um da equipe, um do time." Ninguém que é "um de vocês" fala assim. Carvalho declarou em entrevista: "Lula não precisa de mim. Seria muita pretensão querer ser o espião do Lula no Planalto." O sarcasmo involuntário continua a ser sarcasmo.
Marta Suplicy nunca aprendeu a arte política da sublimação do desejo: a senadora proclama, gritando, o que deve ser sussurrado. Certa vez, nos bastidores de uma reunião da Direção Nacional do PT, incorporou a persona da rainha de Alice para exigir, aos berros, a expulsão imediata de uma corrente minoritária. Agora, na posse da presidente, alertou para a presença perene de Lula - "ele estará sempre disposto a ajudar Dilma no que ela precisar" - e enviou uma mensagem a interlocutores genéricos: "Há uma parceria entre Dilma e Lula que ninguém quebra."
Ninguém quebra? Se Marta tiver razão, Dilma não será, jamais, a "presidente de todos" - e não será nem mesmo a chefe de uma facção. Mas ela pode estar errada, pois a infalibilidade é um atributo exclusivo de Lula. Nessa hipótese, para o bem da democracia, o Brasil terá uma presidente, não um governo subterrâneo.
SOCIÓLOGO, É DOUTOR EM GEOGRAFIA HUMANA PELA USP. E-MAIL: [email protected]
Ah, o exagero - a sombra monstruosa do exagero. "Lula estará conosco." "Sei que a distância de um cargo nada significa para um homem de tamanha grandeza e generosidade": "o maior líder que este país já teve." "Seu nome já está cravado no coração do povo." Não é o elogio incisivo, mesmo mais que protocolar, ao presidente que saiu, companheiro de partido, responsável por seu triunfo. É a louvação desmedida, o adjetivo incontido, o culto despropositado, a metáfora de ressonâncias religiosas. "Sob sua liderança, o povo brasileiro fez a travessia para uma outra margem da história." É Moisés, na travessia das águas e na jornada pelo deserto. Nos seus dois discursos de posse, Dilma Rousseff apalpou a linguagem das tiranias personificadas.
Condutor? Comandante? Eterno Presidente? Líder Genial dos Povos? Grande Timoneiro? A linguagem faz diferença, pois a política, em tempos de paz, é feita de palavras. Democracia é o regime das instituições, não dos líderes. Nas Repúblicas democráticas, nenhum líder sintetiza o povo - e exatamente por isso existem oposições legais. Delinquindo nos interstícios da lei, a Petrobrás batizou com o nome de Lula o campo petrolífero de Tupi. O culto a Lula é uma ferida na alma da democracia. Dilma subiu a rampa fazendo as orações desse culto bizarro.
Os discursos de posse de Dilma devem ser lidos como harmonias interrompidas. A presidente tenta desabrochar, insinua-se e esboça um aceno; ansiosa, tropeça e cai. Aqui e ali, por todos os lados, encontram-se os indícios da sua vontade de governar "para todos os brasileiros e brasileiras". Mas o propósito se estiola no caminho, sempre que colide com um dogma do lulismo.
Há o desejo discernível e, contudo, frustrado de construir uma narrativa realista do período pós-ditadura militar. "Um governo se alicerça no acúmulo de conquistas realizadas ao longo da história. Por isso, ao saudar os avanços extraordinários recentes, é justo lembrar que muitos, a seu tempo e seu modo, deram grandes contribuições às conquistas do Brasil de hoje." Ela poderia ter dito: José Sarney consolidou as liberdades políticas, Fernando Collor iniciou a abertura comercial, Itamar Franco fez o Plano Real, FHC ergueu o edifício da estabilidade econômica. Mas não disse, pois pronunciar o nome de um predecessor seria incorrer no pecado da apostasia: a negação da primazia de Lula.
Lula falou quase sempre como chefe de uma facção - e, no dia de passar a faixa, referiu-se ainda aos opositores como "inimigos". Dilma, ao contrário, almeja falar como a "presidente de todos". Ela estendeu a mão aos partidos de oposição, sem pedir a ninguém "que abdique de suas convicções". Com o olho posto nas lições da campanha eleitoral, enfatizou o imperativo do combate à corrupção e declarou um compromisso "inegociável" com as liberdades individuais, de religião, de imprensa e de opinião. "Prefiro o barulho da imprensa livre ao silêncio das ditaduras", assegurou, reproduzindo a fórmula empregada no discurso de vitória. A declaração será posta à prova logo mais, quando a presidente abrir a gaveta onde repousa o projeto de controle estatal de conteúdos dos meios de comunicação, um presente de grego deixado por Franklin Martins, em nome de Lula.
Dilma prometeu uma política externa "baseada nos valores clássicos da diplomacia brasileira", oferecendo uma justificativa cifrada para o afastamento de Celso Amorim. Recitou, um a um, os princípios inscritos na Constituição: promoção da paz, não intervenção, defesa dos direitos humanos. "Direitos humanos", ela disse! É uma censura indireta a Lula, que elogiava ditaduras e traçava paralelos abomináveis entre presos políticos e criminosos comuns.
Entretanto, os interditos pontilham a estrada como campos minados. Logo depois dos direitos humanos, apartando-se do texto constitucional, Dilma mencionou o "multilateralismo". Em tese, o termo significa, apenas, o fortalecimento das instituições multilaterais, como a ONU, o FMI e o G-20. Na linguagem codificada do lulismo, condensa o impulso antiamericano que moldou a desastrada aproximação com o Irã. O "multilateralismo", nessa acepção pervertida, combina com a permanência de Marco Aurélio Garcia no posto de chanceler fantasma. "Lula estará conosco", lembrou a presidente que se sabe tutelada.
"Eu troquei meu nome e coloquei Dilma lá na cédula", avisou Lula na campanha eleitoral. O ex-presidente interpreta o novo governo como seu terceiro mandato e para exercer a tutela nomeou dois primeiros-ministros informais: Antônio Palocci, tutor externo, e Gilberto Carvalho, tutor interno. Ambos cometeram atos falhos antes do encerramento do primeiro dia de governo. Palocci dirigiu um pedido aos ministros: "Tenham-me como um de vocês, um da equipe, um do time." Ninguém que é "um de vocês" fala assim. Carvalho declarou em entrevista: "Lula não precisa de mim. Seria muita pretensão querer ser o espião do Lula no Planalto." O sarcasmo involuntário continua a ser sarcasmo.
Marta Suplicy nunca aprendeu a arte política da sublimação do desejo: a senadora proclama, gritando, o que deve ser sussurrado. Certa vez, nos bastidores de uma reunião da Direção Nacional do PT, incorporou a persona da rainha de Alice para exigir, aos berros, a expulsão imediata de uma corrente minoritária. Agora, na posse da presidente, alertou para a presença perene de Lula - "ele estará sempre disposto a ajudar Dilma no que ela precisar" - e enviou uma mensagem a interlocutores genéricos: "Há uma parceria entre Dilma e Lula que ninguém quebra."
Ninguém quebra? Se Marta tiver razão, Dilma não será, jamais, a "presidente de todos" - e não será nem mesmo a chefe de uma facção. Mas ela pode estar errada, pois a infalibilidade é um atributo exclusivo de Lula. Nessa hipótese, para o bem da democracia, o Brasil terá uma presidente, não um governo subterrâneo.
SOCIÓLOGO, É DOUTOR EM GEOGRAFIA HUMANA PELA USP. E-MAIL: [email protected]
Published on January 06, 2011 05:55
Inundado pelo QE2
Benn Steil, Valor Econômico
Imagine a cena: você entra no chuveiro, abre a torneira, e nada. Você chamar um encanador que lhe diz que existem furos na tubulação e que o conserto vai custar US$ 1 mil. Você lhe diz para, em vez de consertar, aumentar a pressão da água.
Isso soa sensato? Bem, essa é a lógica por trás da segunda rodada de "afrouxamento quantitativo" - o "quantitative easing", ou ou QE2 na sigla em inglês - do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA), a sua estratégia para manter a canalização inundada de dinheiro até que o crédito comece a fluir livremente de novo dos bancos para as empresas.
Você não esperaria que isso desse certo com seu chuveiro e há pouca razão para esperar que funcione no mercado de financiamento empresarial. O mecanismo de transmissão de crédito nos EUA - e em outros países - está gravemente danificado desde 2007. Nos EUA, as pequenas e médias empresas dependem de bancos de pequeno e médio porte para obter acesso a crédito vital, porém muitos desses bancos continuam zumbis, incapazes de emprestar porque seus balanços patrimoniais estão repletos de empréstimos comerciais e imobiliários incobráveis orginados nos anos de boom.
O Programa de Socorro a Ativos Problemáticos (Tarp, na sigla em inglês) americano foi uma oportunidade para forçar os bancos a se desfazerem de ativos podres - e assim reparar a canalização do crédito. Em vez disso, os bancos só ficaram obrigados a tomar injeções de capital do governo, o que consideram politicamente tóxico. Como resultado, os bancos têm se concentrado em devolver os fundos de socorro o mais rapidamente possível, em vez de empregá-los para aumentar os empréstimos.
O resultado líquido disso é que, embora o Fed tenha levado a taxa de juros para empréstimos de curto prazo para abaixo de zero, a maioria dos bancos só empresta com base em garantias muito maiores e a juros reais muito maiores do que os praticados antes da recessão. Então, agora os EUA continuam penando sob a opção barata: inundando as tubulações para ver no que isso vai dar.
Não nos enganemos: alguma coisa vai jorrar, embora não necessariamente onde deveria. Já vimos a liquidez destinada a aumentar os empréstimos bancários nos EUA vazar, em vez disso, pelas rachaduras, para mercados tão diversos como de commodities agrícolas, metais e dívida de países pobres.
Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel, que repreende o Fed por não abrir muito mais a eclusa monetária, mostrou as loucuras da bruta abordagem keynesiana quase uma década atrás. Em agosto de 2001, ele escreveu: "A força motriz por trás da atual desaceleração é uma queda no investimento empresarial". Mas, "para reaquecer a economia", nos disse ele, "o Fed não tem de restaurar o investimento no setor privado; qualquer tipo de aumento na demanda servirá. Em especial o setor habitacional, que é extremamente sensível às taxas de juro, poderia ajudar a puxar uma recuperação".
Um ano depois, como o Fed não havia se mexido com suficiente agressividade, em sua opinião, Krugman intuiu que "é preciso um grande aumento nos gastos das famílias para compensar o moribundo investimento das empresas. E para fazer isso (o Fed) precisa criar uma bolha imobiliária para substituir a bolha da Nasdaq". Desejo atendido.
Porém, tanto os EUA como o mundo não podem passar novamente por tudo isso. Não se pode esperar que o mundo fora dos EUA, que depende do dólar como seu principal veículo de comércio e, portanto, como ativo de reserva, assista passivamente enquanto dólares continuam sendo despejados em seus mercados de câmbio, commodities e ativos, sem um fim claro à vista.
A Alemanha tem criticado a abordagem americana, que põe seu banco central no centro da estratégia de recuperação. Mas a zona do euro está fazendo o mesmo.
Veja a feitiçaria do socorro à Irlanda. A irlandesa Nacional Asset Management Agency (Nama) foi criada em 2009 para fazer uma limpeza nos balanços patrimoniais dos bancos irlandeses. Mas ela faz isso dando "notas promissórias" recém-criadas - e não euros - aos bancos, em troca de créditos de cobrança duvidosa. Os bancos então descarregam as promissórias no Banco Central Europeu, que fornece, então, o dinheiro de verdade.
Uma vez que a Nama troca as promissórias por dívida bancária a apenas metade de seu valor de face, essa operação triangular pode resultar numa perda de capital de €1 para cada euro que os bancos recebem do BCE. Evidentemente, as promissórias agora apresentadas ao BCE têm de ser depreciadas, o que ameaça destruir o balanço patrimonial do próprio BCE.
Qual é a lógica dessa ciranda maluca? Os bancos alemães detêm pelo menos €48 bilhões de dívida bancária irlandesa, os bancos britânicos têm outros €31 bilhões e os bancos franceses mais €19 bilhões. Desde junho de 2008, bancos alemães, britânicos e franceses retiraram o equivalente a €253 bilhões em crédito de bancos irlandeses e de outros tomadores irlandeses de empréstimos - correspondentes a 70% do total dos fundos estrangeiros sacados. As autoridades desses países estão agora tentando proteger seus bancos contra prejuízos, fingindo preocupação de boa vizinhança em relação ao governo irlandês.
Durante décadas, os Estados Unidos e a Europa ditaram ao mundo regras sobre a importância da limpeza de casa depois de uma crise financeira: especialmente no que diz respeito a corrigir ou dar um fim a bancos zumbis. É hora de engolir o nosso próprio remédio e retomar o difícil trabalho de consertar nossos sistemas bancários. Confiar em que os bancos centrais desencalhem os EUA e as economias europeias é uma abdicação de responsabilidade que nos vai custar muito caro no futuro.
Benn Steil é diretor de Economia Internacional no Council on Foreign Relations e coautor de "Money, Markets, and Sovereignty" (Dinheiro, mercados e soberania). Foi vencedor do Hayek Book Prize em 2010. Copyright: Project Syndicate, 2011.
Imagine a cena: você entra no chuveiro, abre a torneira, e nada. Você chamar um encanador que lhe diz que existem furos na tubulação e que o conserto vai custar US$ 1 mil. Você lhe diz para, em vez de consertar, aumentar a pressão da água.
Isso soa sensato? Bem, essa é a lógica por trás da segunda rodada de "afrouxamento quantitativo" - o "quantitative easing", ou ou QE2 na sigla em inglês - do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA), a sua estratégia para manter a canalização inundada de dinheiro até que o crédito comece a fluir livremente de novo dos bancos para as empresas.
Você não esperaria que isso desse certo com seu chuveiro e há pouca razão para esperar que funcione no mercado de financiamento empresarial. O mecanismo de transmissão de crédito nos EUA - e em outros países - está gravemente danificado desde 2007. Nos EUA, as pequenas e médias empresas dependem de bancos de pequeno e médio porte para obter acesso a crédito vital, porém muitos desses bancos continuam zumbis, incapazes de emprestar porque seus balanços patrimoniais estão repletos de empréstimos comerciais e imobiliários incobráveis orginados nos anos de boom.
O Programa de Socorro a Ativos Problemáticos (Tarp, na sigla em inglês) americano foi uma oportunidade para forçar os bancos a se desfazerem de ativos podres - e assim reparar a canalização do crédito. Em vez disso, os bancos só ficaram obrigados a tomar injeções de capital do governo, o que consideram politicamente tóxico. Como resultado, os bancos têm se concentrado em devolver os fundos de socorro o mais rapidamente possível, em vez de empregá-los para aumentar os empréstimos.
O resultado líquido disso é que, embora o Fed tenha levado a taxa de juros para empréstimos de curto prazo para abaixo de zero, a maioria dos bancos só empresta com base em garantias muito maiores e a juros reais muito maiores do que os praticados antes da recessão. Então, agora os EUA continuam penando sob a opção barata: inundando as tubulações para ver no que isso vai dar.
Não nos enganemos: alguma coisa vai jorrar, embora não necessariamente onde deveria. Já vimos a liquidez destinada a aumentar os empréstimos bancários nos EUA vazar, em vez disso, pelas rachaduras, para mercados tão diversos como de commodities agrícolas, metais e dívida de países pobres.
Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel, que repreende o Fed por não abrir muito mais a eclusa monetária, mostrou as loucuras da bruta abordagem keynesiana quase uma década atrás. Em agosto de 2001, ele escreveu: "A força motriz por trás da atual desaceleração é uma queda no investimento empresarial". Mas, "para reaquecer a economia", nos disse ele, "o Fed não tem de restaurar o investimento no setor privado; qualquer tipo de aumento na demanda servirá. Em especial o setor habitacional, que é extremamente sensível às taxas de juro, poderia ajudar a puxar uma recuperação".
Um ano depois, como o Fed não havia se mexido com suficiente agressividade, em sua opinião, Krugman intuiu que "é preciso um grande aumento nos gastos das famílias para compensar o moribundo investimento das empresas. E para fazer isso (o Fed) precisa criar uma bolha imobiliária para substituir a bolha da Nasdaq". Desejo atendido.
Porém, tanto os EUA como o mundo não podem passar novamente por tudo isso. Não se pode esperar que o mundo fora dos EUA, que depende do dólar como seu principal veículo de comércio e, portanto, como ativo de reserva, assista passivamente enquanto dólares continuam sendo despejados em seus mercados de câmbio, commodities e ativos, sem um fim claro à vista.
A Alemanha tem criticado a abordagem americana, que põe seu banco central no centro da estratégia de recuperação. Mas a zona do euro está fazendo o mesmo.
Veja a feitiçaria do socorro à Irlanda. A irlandesa Nacional Asset Management Agency (Nama) foi criada em 2009 para fazer uma limpeza nos balanços patrimoniais dos bancos irlandeses. Mas ela faz isso dando "notas promissórias" recém-criadas - e não euros - aos bancos, em troca de créditos de cobrança duvidosa. Os bancos então descarregam as promissórias no Banco Central Europeu, que fornece, então, o dinheiro de verdade.
Uma vez que a Nama troca as promissórias por dívida bancária a apenas metade de seu valor de face, essa operação triangular pode resultar numa perda de capital de €1 para cada euro que os bancos recebem do BCE. Evidentemente, as promissórias agora apresentadas ao BCE têm de ser depreciadas, o que ameaça destruir o balanço patrimonial do próprio BCE.
Qual é a lógica dessa ciranda maluca? Os bancos alemães detêm pelo menos €48 bilhões de dívida bancária irlandesa, os bancos britânicos têm outros €31 bilhões e os bancos franceses mais €19 bilhões. Desde junho de 2008, bancos alemães, britânicos e franceses retiraram o equivalente a €253 bilhões em crédito de bancos irlandeses e de outros tomadores irlandeses de empréstimos - correspondentes a 70% do total dos fundos estrangeiros sacados. As autoridades desses países estão agora tentando proteger seus bancos contra prejuízos, fingindo preocupação de boa vizinhança em relação ao governo irlandês.
Durante décadas, os Estados Unidos e a Europa ditaram ao mundo regras sobre a importância da limpeza de casa depois de uma crise financeira: especialmente no que diz respeito a corrigir ou dar um fim a bancos zumbis. É hora de engolir o nosso próprio remédio e retomar o difícil trabalho de consertar nossos sistemas bancários. Confiar em que os bancos centrais desencalhem os EUA e as economias europeias é uma abdicação de responsabilidade que nos vai custar muito caro no futuro.
Benn Steil é diretor de Economia Internacional no Council on Foreign Relations e coautor de "Money, Markets, and Sovereignty" (Dinheiro, mercados e soberania). Foi vencedor do Hayek Book Prize em 2010. Copyright: Project Syndicate, 2011.
Published on January 06, 2011 05:49
January 3, 2011
O fanatismo de Rousseau

Meu artigo de estréia no OrdemLivre.org, sobre o fanatismo de Rousseau analisado pelo filósofo Isaiah Berlin.
Published on January 03, 2011 10:07
December 29, 2010
Campo Lula

A área de Tupi teve sua comercialidade declarada nesta quarta-feira pela Petrobras e os sócios Galp e BG. O novo campo será denominado Lula, e tem reservas estimadas em 6,5 bilhões de barris de petróleo e gás recuperáveis. Tupi era o nome provisório da área descoberta. Após a declaração de comercialidade, os campos recebem nomes de formas marinhas.
Comento: O futuro ex-presidente Lula disse que quem fez a maior capitalização em bolsa este ano não foi a Fiat ou a GM, mas "um metalúrgico de São Bernardo do Campo". A confusão entre público e privado chegou ao seu ápice durante o (des)governo Lula. É tudo dele! "O Estado sou eu"! "O povo sou eu"! Lula é dono da Petrobras. Nada mais natural que o gigantesco poço de Tupi mudar de nome para Campo Lula. É triste ver in loco o nascimento de um patético culto à personalidade desses. Que coisa mais atrasada!
Published on December 29, 2010 07:00
December 28, 2010
Mensagem de fim de ano
Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal
Encarregado de escrever este último "comentário do dia" pelo Instituto Liberal, optei por uma mensagem mais abrangente do que simplesmente analisar alguma notícia de hoje. Ano novo; vida nova: eis o que diz o ditado. Nesta época do ano, todos gostam de rever erros e acertos (mais acertos que erros) e, acima de tudo, planejar metas audaciosas para o novo ano, que infelizmente serão ignoradas na maioria dos casos. Assim é a "natureza humana".
Do ponto de vista político-econômico, o ano que se encerra combina com o fim da Era Lula no governo. Qualquer liberal, naturalmente, só tem a celebrar este término de um governo incompetente e corrupto. A inflação representa uma ameaça crescente, e o inchaço da máquina pública é a grande "herança maldita" que Lula deixa a sua sucessora. Nenhuma reforma estrutural foi feita nos oito anos de gestão petista. Infelizmente, os liberais nada têm a comemorar neste sentido, pois o poder passa para Dilma Rousseff, cria de Lula e defensora de um Estado controlador ao extremo.
Resta, portanto, focar no âmbito individual. Que cada leitor e leitora possa realizar sonhos particulares em 2011, se os obstáculos naturais e aqueles artificialmente criados pelo governo permitirem. Os percalços no caminho fazem parte de qualquer conquista digna do nome. Em mar calmo todos são bons navegadores. E que os fracassos sirvam de lição, pois eles são inevitáveis. Nossa única certeza na vida é a morte e, como diria um psicanalista, toda busca por certezas acaba sendo um "desejo de morte". Seitas fechadas, utopias, crenças dogmáticas, panacéias são coisas que trazem conforto – o mesmo conforto de uma pedra sem vida!
Aos homens foi negada a possibilidade de onisciência. Com base neste fato, os liberais reconhecem a relevância da humildade e da tolerância. Os tolos e fanáticos estão sempre "certos" de tudo, enquanto os mais sábios alimentam inúmeras dúvidas. Como disse Darwin, "a ignorância traz muito mais certezas que o conhecimento". Saibamos, portanto, respeitar ao máximo possível as liberdades individuais, incluindo suas idiossincrasias. O desejo é individual, sempre. As paixões nos tornam humanos, assim como a razão. O difícil é achar o equilíbrio adequado entre ambas.
E que venha o ano novo, com suas surpresas e incertezas, pois a vida sem estas seria insuportável.
Encarregado de escrever este último "comentário do dia" pelo Instituto Liberal, optei por uma mensagem mais abrangente do que simplesmente analisar alguma notícia de hoje. Ano novo; vida nova: eis o que diz o ditado. Nesta época do ano, todos gostam de rever erros e acertos (mais acertos que erros) e, acima de tudo, planejar metas audaciosas para o novo ano, que infelizmente serão ignoradas na maioria dos casos. Assim é a "natureza humana".
Do ponto de vista político-econômico, o ano que se encerra combina com o fim da Era Lula no governo. Qualquer liberal, naturalmente, só tem a celebrar este término de um governo incompetente e corrupto. A inflação representa uma ameaça crescente, e o inchaço da máquina pública é a grande "herança maldita" que Lula deixa a sua sucessora. Nenhuma reforma estrutural foi feita nos oito anos de gestão petista. Infelizmente, os liberais nada têm a comemorar neste sentido, pois o poder passa para Dilma Rousseff, cria de Lula e defensora de um Estado controlador ao extremo.
Resta, portanto, focar no âmbito individual. Que cada leitor e leitora possa realizar sonhos particulares em 2011, se os obstáculos naturais e aqueles artificialmente criados pelo governo permitirem. Os percalços no caminho fazem parte de qualquer conquista digna do nome. Em mar calmo todos são bons navegadores. E que os fracassos sirvam de lição, pois eles são inevitáveis. Nossa única certeza na vida é a morte e, como diria um psicanalista, toda busca por certezas acaba sendo um "desejo de morte". Seitas fechadas, utopias, crenças dogmáticas, panacéias são coisas que trazem conforto – o mesmo conforto de uma pedra sem vida!
Aos homens foi negada a possibilidade de onisciência. Com base neste fato, os liberais reconhecem a relevância da humildade e da tolerância. Os tolos e fanáticos estão sempre "certos" de tudo, enquanto os mais sábios alimentam inúmeras dúvidas. Como disse Darwin, "a ignorância traz muito mais certezas que o conhecimento". Saibamos, portanto, respeitar ao máximo possível as liberdades individuais, incluindo suas idiossincrasias. O desejo é individual, sempre. As paixões nos tornam humanos, assim como a razão. O difícil é achar o equilíbrio adequado entre ambas.
E que venha o ano novo, com suas surpresas e incertezas, pois a vida sem estas seria insuportável.
Published on December 28, 2010 12:30
O Índice Bovespa e a economia em direções opostas?
Rodrigo Constantino, no Valor Econômico
Boa parte dos investidores olha o Ibovespa como indicador da bolsa brasileira. Quem assim o faz, provavelmente está decepcionado com o desempenho do índice este ano. Enquanto o crescimento do PIB deve passar de 7,5% no ano, o Ibovespa está em território levemente negativo até a gora. Há algumas explicações básicas para esse fenômeno.
Em primeiro lugar, a bolsa e a economia nem sempre andam pari passu, pois o mercado de ações é um mecanismo antecipatório, ou seja, projeta os resultados futuros das empresas e os traz a valor presente. O mercado já olha para o crescimento esperado em 2011, em patamar bem inferior ao deste ano. Ainda assim, o desempenho do Ibovespa parece insatisfatório, pois os economistas falam em 4,5% de crescimento, o que não é nada mal se comparado ao restante do mundo.
A segunda explicação para o ano medíocre do Ibovespa está em sua metodologia de cálculo para o peso das ações no índice. A Petrobras representa quase 12% do Ibovespa, enquanto o setor siderúrgico também apresenta peso elevado. Ocorre que tanto Petrobras quanto as siderúrgicas tiveram péssimo desempenho este ano, por motivos distintos. Isso representou quase cinco pontos percentuais a menos no desempenho do índice em 2010.
As ações da Petrobras caíram cerca de 30% este ano, basicamente por conta do maior risco político após a operação de aumento de capital. A questionável precificação dos ativos de pré-sal demonstrou que o real interesse do governo era expandir sua participação à custa dos acionistas minoritários.
Como a Petrobras possui um programa gigantesco de investimento para os próximos anos, os investidores temem, com razão, uma destruição maciça de valor da empresa, caso o governo utilize critérios políticos em vez de econômicos nas suas decisões.
A Petrobras pode ser uma aposta interessante para 2011, até porque o preço do petróleo segue firme acima de US$ 80 por barril; mas isso vai depender de uma mudança na governança da empresa, que precisa rejeitar a tentação populista e focar no retorno financeiro. Se isso não ocorrer, ela vai continuar ignorada pelos investidores.
Já o setor siderúrgico tem sido vítima da forte apreciação do câmbio e seu concomitante impacto nas importações do setor. Tradicionalmente protegidas da concorrência internacional, as siderúrgicas brasileiras operavam com ótimas margens de lucratividade. Esse cenário não existe mais, e a balança comercial do setor praticamente virou. A Gerdau e a Usiminas perderam mais de 20% de seu valor de mercado em 2010, prejudicando o Ibovespa. As perspectivas não são muito animadoras para 2011.
A Vale foi a locomotiva do Ibovespa no ano. Suas ações subiram quase 20%, e com seu peso acima de 15% no Ibovespa, ela anulou o efeito negativo da Petrobras. A Vale tem sido o melhor veículo brasileiro do chamado "China play", a aposta em ativos que capturam o acelerado crescimento chinês e sua insaciável fome por recursos básicos. A crescente pressão inflacionária na China coloca em risco essa aposta, pois o aumento da taxa de juros lá poderá afetar seu crescimento e, por tabela, as importações de commodities.
Os setores de maior destaque foram, sem dúvida, aqueles ligados ao crescimento do varejo e do crédito no país. Várias empresas de consumo, por exemplo, subiram mais de 20% este ano, e algumas chegaram a dobrar de valor. O "valuation" dessas empresas é o ponto fraco: muitas apresentam P/L acima de 20x para 2011, incorporando elevado crescimento nas estimativas de lucro. O risco de decepção não é desprezível.
O setor de construção civil chegou a ganhar mais de 20% no ano, após ter quase triplicado em 2009; mas com a recente pressão inflacionária e seu efeito na expectativa de juros maiores para 2011, ele devolveu boa parte da alta. Para o ano que vem, seu desempenho dependerá muito do impacto dos juros maiores na economia e no crédito. Se o governo não fizer um ajuste fiscal sério, o setor poderá sofrer bastante.
Como fica claro, não há barganhas evidentes na bolsa brasileira atualmente. Apesar do forte crescimento econômico, o Ibovespa ficou praticamente estável no ano, com bons motivos. Seu desempenho em 2011, deixando de lado o cenário internacional, vai depender muito das medidas do governo.
Se este fizer seu dever de casa, cortando gastos e adotando uma gestão mais racional na Petrobras, ainda há espaço para razoável valorização. Caso contrário, a renda fixa poderá ser uma opção mais atraente que a bolsa em termos gerais.
Rodrigo Constantino é economista e gestor de recursos
Boa parte dos investidores olha o Ibovespa como indicador da bolsa brasileira. Quem assim o faz, provavelmente está decepcionado com o desempenho do índice este ano. Enquanto o crescimento do PIB deve passar de 7,5% no ano, o Ibovespa está em território levemente negativo até a gora. Há algumas explicações básicas para esse fenômeno.
Em primeiro lugar, a bolsa e a economia nem sempre andam pari passu, pois o mercado de ações é um mecanismo antecipatório, ou seja, projeta os resultados futuros das empresas e os traz a valor presente. O mercado já olha para o crescimento esperado em 2011, em patamar bem inferior ao deste ano. Ainda assim, o desempenho do Ibovespa parece insatisfatório, pois os economistas falam em 4,5% de crescimento, o que não é nada mal se comparado ao restante do mundo.
A segunda explicação para o ano medíocre do Ibovespa está em sua metodologia de cálculo para o peso das ações no índice. A Petrobras representa quase 12% do Ibovespa, enquanto o setor siderúrgico também apresenta peso elevado. Ocorre que tanto Petrobras quanto as siderúrgicas tiveram péssimo desempenho este ano, por motivos distintos. Isso representou quase cinco pontos percentuais a menos no desempenho do índice em 2010.
As ações da Petrobras caíram cerca de 30% este ano, basicamente por conta do maior risco político após a operação de aumento de capital. A questionável precificação dos ativos de pré-sal demonstrou que o real interesse do governo era expandir sua participação à custa dos acionistas minoritários.
Como a Petrobras possui um programa gigantesco de investimento para os próximos anos, os investidores temem, com razão, uma destruição maciça de valor da empresa, caso o governo utilize critérios políticos em vez de econômicos nas suas decisões.
A Petrobras pode ser uma aposta interessante para 2011, até porque o preço do petróleo segue firme acima de US$ 80 por barril; mas isso vai depender de uma mudança na governança da empresa, que precisa rejeitar a tentação populista e focar no retorno financeiro. Se isso não ocorrer, ela vai continuar ignorada pelos investidores.
Já o setor siderúrgico tem sido vítima da forte apreciação do câmbio e seu concomitante impacto nas importações do setor. Tradicionalmente protegidas da concorrência internacional, as siderúrgicas brasileiras operavam com ótimas margens de lucratividade. Esse cenário não existe mais, e a balança comercial do setor praticamente virou. A Gerdau e a Usiminas perderam mais de 20% de seu valor de mercado em 2010, prejudicando o Ibovespa. As perspectivas não são muito animadoras para 2011.
A Vale foi a locomotiva do Ibovespa no ano. Suas ações subiram quase 20%, e com seu peso acima de 15% no Ibovespa, ela anulou o efeito negativo da Petrobras. A Vale tem sido o melhor veículo brasileiro do chamado "China play", a aposta em ativos que capturam o acelerado crescimento chinês e sua insaciável fome por recursos básicos. A crescente pressão inflacionária na China coloca em risco essa aposta, pois o aumento da taxa de juros lá poderá afetar seu crescimento e, por tabela, as importações de commodities.
Os setores de maior destaque foram, sem dúvida, aqueles ligados ao crescimento do varejo e do crédito no país. Várias empresas de consumo, por exemplo, subiram mais de 20% este ano, e algumas chegaram a dobrar de valor. O "valuation" dessas empresas é o ponto fraco: muitas apresentam P/L acima de 20x para 2011, incorporando elevado crescimento nas estimativas de lucro. O risco de decepção não é desprezível.
O setor de construção civil chegou a ganhar mais de 20% no ano, após ter quase triplicado em 2009; mas com a recente pressão inflacionária e seu efeito na expectativa de juros maiores para 2011, ele devolveu boa parte da alta. Para o ano que vem, seu desempenho dependerá muito do impacto dos juros maiores na economia e no crédito. Se o governo não fizer um ajuste fiscal sério, o setor poderá sofrer bastante.
Como fica claro, não há barganhas evidentes na bolsa brasileira atualmente. Apesar do forte crescimento econômico, o Ibovespa ficou praticamente estável no ano, com bons motivos. Seu desempenho em 2011, deixando de lado o cenário internacional, vai depender muito das medidas do governo.
Se este fizer seu dever de casa, cortando gastos e adotando uma gestão mais racional na Petrobras, ainda há espaço para razoável valorização. Caso contrário, a renda fixa poderá ser uma opção mais atraente que a bolsa em termos gerais.
Rodrigo Constantino é economista e gestor de recursos
Published on December 28, 2010 02:19
A ditadura do politicamente correto
Rodrigo Constantino, O Globo
"A unanimidade é burra." (Nelson Rodrigues)
Ninguém insiste tanto na conformidade como aqueles que advogam "diversidade". Sob o manto de um discurso progressista jaz muitas vezes um autoritarismo típico de pessoas que gostariam, no fundo, de um mundo uniforme, onde todos rezam o mesmo credo. A Utopia de More, a Cidade do Sol de Campanella, a República platônica, enfim, "um mundo melhor é possível". Se ao menos todos abandonassem o egoísmo, a ganância, e se tornassem almas conscientes e engajadas...
Mesmo se for preciso "forçar o indivíduo a ser livre", como defendeu Rousseau, esse parece um preço aceitável a se pagar pelo sonhado "progresso". Foi com base nesta mentalidade que milhões de inocentes foram sacrificados no altar de ideologias coletivistas. Atualmente, os "progressistas" buscaram refúgio em novas seitas, mas a meta continua a mesma: "purificar" a humanidade e criar um paraíso terrestre onde todos serão igualmente "felizes" e "saudáveis".
A obsessão pela saúde e pela felicidade, assim como a ditadura do politicamente correto são claramente sintomas da modernidade. Vivemos na era da covardia, onde poucos têm coragem de se levantar contra o rebanho. Estamos sob o controle dos eufemismos, com a linguagem sendo obliterada para proteger os mais "sensíveis". Todos são "especiais", o mesmo que dizer que ninguém o é. Chegamos à era do conformismo: ninguém pode desviar do padrão definido, pois as diferenças incomodam muito. Todos devem adotar a mesma cartilha "livre de preconceitos".
Até mesmo o Papai Noel já foi vítima desta obtusa mentalidade. A obesidade é um problema de saúde preocupante no mundo. Um dos culpados? Sim, o Papai Noel. Um médico australiano chegou a afirmar que Papai Noel é um "pária da saúde pública", e seria melhor se ele fosse retratado sem aquela "pança", sua marca registrada. Afinal, o bom velhinho é um ícone da garotada, e no mundo atual não fica bem um barrigão daqueles influenciando as crianças. Papai Noel "sarado", eis um típico sinal dos tempos.
Qualquer pessoa com mais de 30 anos deve recordar daqueles cigarros de chocolate que as crianças adoravam no passado. Isso seria impensável hoje em dia. Chocolate, e ainda por cima em forma de cigarro? Seria politicamente incorreto demais para o mundo moderno. Diriam que as crianças vulneráveis seriam fumantes compulsivas, tal como acusam filmes e jogos violentos pela violência.
Pensar na possibilidade de que os próprios pais devem educar seus filhos, impondo limites e dizendo "não", parece algo estranho demais para os engenheiros sociais da atualidade. As "crianças mimadas", os adultos modernos, preferem delegar a função ao governo, que será responsável pela "pureza" das propagandas. Quem precisa de liberdade de escolha quando se tem o governo para controlar nossas vidas?
Parte importante da liberdade é o direito de cada um ir para o "inferno" à sua maneira. O alimento de um pode ser o veneno do outro. Esta variabilidade humana nos impõe a necessidade da liberdade individual e da tolerância. Ninguém sabe qual o desejo do outro. Infelizmente, estamos vivendo cada vez mais sob a ditadura da maioria. O paraíso idealizado pelos "progressistas" seria um mundo com tudo reciclado, pessoas vestindo roupas iguais, comendo apenas alimentos orgânicos, e andando de bicicleta para cima e para baixo. Paradoxalmente, os "progressistas" odeiam o progresso!
É neste preocupante contexto que chegamos ao fim de mais uma década. Ao longo do processo, alguns indivíduos ousaram remar contra a maré, mesmo que não passassem de vozes isoladas em meio às multidões. Entre os brasileiros, tivemos figuras como Paulo Francis e Nelson Rodrigues, sempre lutando contra a imposição dos medíocres, derrubando os velhos chavões populistas. Seguindo esta tradição, o filósofo Luiz Felipe Pondé lançou novo livro, "Contra um Mundo Melhor", que pode ser visto como um antídoto amargo a esta doença moderna.
A frase que abre o primeiro ensaio já dá o tom da obra: "Detesto a vida perfeita". Pondé liga sua metralhadora giratória contra todas as mais nobres bandeiras politicamente corretas, desnudando-as e expondo sua hipocrisia. Numa época em que o homem é praticamente obrigado a ser "feliz", ainda que seja à base de Prozac, os ataques mal-humorados de Pondé servem para alertar sobre os enormes perigos desta trajetória, tal como Huxley havia feito com seu "Admirável Mundo Novo".
Que saibamos desconfiar mais da cruzada moral dos "progressistas" e sua retórica politicamente correta. São meus votos para 2011.
"A unanimidade é burra." (Nelson Rodrigues)
Ninguém insiste tanto na conformidade como aqueles que advogam "diversidade". Sob o manto de um discurso progressista jaz muitas vezes um autoritarismo típico de pessoas que gostariam, no fundo, de um mundo uniforme, onde todos rezam o mesmo credo. A Utopia de More, a Cidade do Sol de Campanella, a República platônica, enfim, "um mundo melhor é possível". Se ao menos todos abandonassem o egoísmo, a ganância, e se tornassem almas conscientes e engajadas...
Mesmo se for preciso "forçar o indivíduo a ser livre", como defendeu Rousseau, esse parece um preço aceitável a se pagar pelo sonhado "progresso". Foi com base nesta mentalidade que milhões de inocentes foram sacrificados no altar de ideologias coletivistas. Atualmente, os "progressistas" buscaram refúgio em novas seitas, mas a meta continua a mesma: "purificar" a humanidade e criar um paraíso terrestre onde todos serão igualmente "felizes" e "saudáveis".
A obsessão pela saúde e pela felicidade, assim como a ditadura do politicamente correto são claramente sintomas da modernidade. Vivemos na era da covardia, onde poucos têm coragem de se levantar contra o rebanho. Estamos sob o controle dos eufemismos, com a linguagem sendo obliterada para proteger os mais "sensíveis". Todos são "especiais", o mesmo que dizer que ninguém o é. Chegamos à era do conformismo: ninguém pode desviar do padrão definido, pois as diferenças incomodam muito. Todos devem adotar a mesma cartilha "livre de preconceitos".
Até mesmo o Papai Noel já foi vítima desta obtusa mentalidade. A obesidade é um problema de saúde preocupante no mundo. Um dos culpados? Sim, o Papai Noel. Um médico australiano chegou a afirmar que Papai Noel é um "pária da saúde pública", e seria melhor se ele fosse retratado sem aquela "pança", sua marca registrada. Afinal, o bom velhinho é um ícone da garotada, e no mundo atual não fica bem um barrigão daqueles influenciando as crianças. Papai Noel "sarado", eis um típico sinal dos tempos.
Qualquer pessoa com mais de 30 anos deve recordar daqueles cigarros de chocolate que as crianças adoravam no passado. Isso seria impensável hoje em dia. Chocolate, e ainda por cima em forma de cigarro? Seria politicamente incorreto demais para o mundo moderno. Diriam que as crianças vulneráveis seriam fumantes compulsivas, tal como acusam filmes e jogos violentos pela violência.
Pensar na possibilidade de que os próprios pais devem educar seus filhos, impondo limites e dizendo "não", parece algo estranho demais para os engenheiros sociais da atualidade. As "crianças mimadas", os adultos modernos, preferem delegar a função ao governo, que será responsável pela "pureza" das propagandas. Quem precisa de liberdade de escolha quando se tem o governo para controlar nossas vidas?
Parte importante da liberdade é o direito de cada um ir para o "inferno" à sua maneira. O alimento de um pode ser o veneno do outro. Esta variabilidade humana nos impõe a necessidade da liberdade individual e da tolerância. Ninguém sabe qual o desejo do outro. Infelizmente, estamos vivendo cada vez mais sob a ditadura da maioria. O paraíso idealizado pelos "progressistas" seria um mundo com tudo reciclado, pessoas vestindo roupas iguais, comendo apenas alimentos orgânicos, e andando de bicicleta para cima e para baixo. Paradoxalmente, os "progressistas" odeiam o progresso!
É neste preocupante contexto que chegamos ao fim de mais uma década. Ao longo do processo, alguns indivíduos ousaram remar contra a maré, mesmo que não passassem de vozes isoladas em meio às multidões. Entre os brasileiros, tivemos figuras como Paulo Francis e Nelson Rodrigues, sempre lutando contra a imposição dos medíocres, derrubando os velhos chavões populistas. Seguindo esta tradição, o filósofo Luiz Felipe Pondé lançou novo livro, "Contra um Mundo Melhor", que pode ser visto como um antídoto amargo a esta doença moderna.
A frase que abre o primeiro ensaio já dá o tom da obra: "Detesto a vida perfeita". Pondé liga sua metralhadora giratória contra todas as mais nobres bandeiras politicamente corretas, desnudando-as e expondo sua hipocrisia. Numa época em que o homem é praticamente obrigado a ser "feliz", ainda que seja à base de Prozac, os ataques mal-humorados de Pondé servem para alertar sobre os enormes perigos desta trajetória, tal como Huxley havia feito com seu "Admirável Mundo Novo".
Que saibamos desconfiar mais da cruzada moral dos "progressistas" e sua retórica politicamente correta. São meus votos para 2011.
Published on December 28, 2010 02:09
December 25, 2010
Morre Orestes Quércia
"É com pesar que recebo a notícia da morte de Orestes Quércia. São Paulo e o Brasil vão se lembrar dele como um expoente da resistência democrática, um governador de muitas realizações e um defensor do desenvolvimento do país. Em todas as circunstâncias, foi um lutador." (Dilma Rousseff Linhares)
Um país que tem heróis como Quércia, Sarney e Lula está perdido mesmo!
Um país que tem heróis como Quércia, Sarney e Lula está perdido mesmo!
Published on December 25, 2010 07:31
December 23, 2010
Mensagem de Natal
Como não acredito em deuses faz muito tempo, e sou católico somente por inércia, o sentido do Natal se resume, para mim, em duas coisas apenas: família e presentes. Desejo a todos um excelente momento ao lado de seus entes queridos, pois "this is what it's all about". E, claro, bons presentes, pois a hipocrisia é algo que combato sempre, e quem não gosta de um presente legal?
Aproveito para desejar um ótimo ano novo, que já começa com uma coisa espetacular, que não deve ser ignorada: Lula vai estar fora da presidência! Ao menos oficialmente.
Feliz Natal e um próspero 2011!
Aproveito para desejar um ótimo ano novo, que já começa com uma coisa espetacular, que não deve ser ignorada: Lula vai estar fora da presidência! Ao menos oficialmente.
Feliz Natal e um próspero 2011!
Published on December 23, 2010 15:13
FARC são terroristas
Deu no G1: A Câmara de Deputados chilena aprovou na terça-feira um texto que declara a guerrilha colombiana das Farc uma "organização terrorista", anunciou o Legislativo nesta quarta-feira (22).
"Com 39 votos a favor e dois contra, a Câmara de Deputados aprovou um projeto de acordo que declara as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) como uma 'organização terrorista' e expressa seu repúdio às ligações que ela tenha com partidos ou grupos sociais de qualquer natureza que existam em nosso país", afirma o comunicado da Câmara.
Comento: Que diferença entre esta postura e a dos governantes brasileiros! Enquanto o PT de Lula insiste em flertar com os terroristas das FARC, que celebraram a vitória de Lula e agora de Dilma, além de terem doado até dinheiro para a campanha, segundo a revista Veja noticiou, os chilenos colocam os pingos nos is e chamam as coisas pelo nome certo. É por isso, e outras coisas, que o Chile é o país mais avançado da América Latina. Está razoavelmente livre do câncer populista que infesta a esquerda latino-americana, dominada por caudilhos como Chávez e companhia. Parabéns, Chile!
"Com 39 votos a favor e dois contra, a Câmara de Deputados aprovou um projeto de acordo que declara as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) como uma 'organização terrorista' e expressa seu repúdio às ligações que ela tenha com partidos ou grupos sociais de qualquer natureza que existam em nosso país", afirma o comunicado da Câmara.
Comento: Que diferença entre esta postura e a dos governantes brasileiros! Enquanto o PT de Lula insiste em flertar com os terroristas das FARC, que celebraram a vitória de Lula e agora de Dilma, além de terem doado até dinheiro para a campanha, segundo a revista Veja noticiou, os chilenos colocam os pingos nos is e chamam as coisas pelo nome certo. É por isso, e outras coisas, que o Chile é o país mais avançado da América Latina. Está razoavelmente livre do câncer populista que infesta a esquerda latino-americana, dominada por caudilhos como Chávez e companhia. Parabéns, Chile!
Published on December 23, 2010 05:40
Rodrigo Constantino's Blog
- Rodrigo Constantino's profile
- 32 followers
Rodrigo Constantino isn't a Goodreads Author
(yet),
but they
do have a blog,
so here are some recent posts imported from
their feed.
